Eu abro os olhos, não encontro nada para me dar referência de que horas são. Tudo está num tom de cinza, não sei ao certo dizer se é dia ou noite. Me levanto, olho pelas janelas. Nada além da névoa. Pego algo para comer, na real não faz diferença, e só um bloco cinza que fui instruída a comer para me manter viva.
O mais estranho é que as portas e janelas não estão trancadas, eu posso quando quiser. Mas por algum motivo eu não saio. Talvez seja por medo ou preguiça de desbravar. As instruções são claras. Eu posso sair quando quiser!
Mas lá está ela, a névoa rodeando tudo, não consigo enxergar meio metro à minha frente.
Na parede ao lado da geladeira tem um quadro com as instruções:
1 - Você pode sair quando quiser.
2 - A comida é projetada com todos os nutrientes necessários para a sobrevivência.
3 - A regra número 1 é clara, mas não aconselhável.
Eu não sei a quanto tempo estou aqui. Se existiram pessoas aqui antes de mim?
Não tem espelhos na casa, mas se eu quiser me ver basta forçar um pouco as vistas na janela que consigo ver como estou. Cansada, exausta e com perguntas demais para respostas que não conseguiria responder.
Estou cansada, vou dormir.
Em outro dia acordo e tem um livro na minha cabeceira. Tentei várias vezes terminá-lo, mas sempre parava, e quando ia voltar, tinha esquecido tudo e começava novamente. Não era o tipo de livro que me prendia. Só tinha um detalhe que me mantinha entretida, um tal de Deus ex machina. Que era algo além da nossa compreensão, eu sonhava com isso a noite, e tbm que tinha uma lanterna gigante que jogava luz em toda essa névoa é via o que tinha no além, no desconhecido.
O livro falava de uma mulher que sofria de crises de pânico, apagava e sempre após tinha um sapo por perto que sempre que ela tentava afastá-lo, ele sumia, porém voltava. Aquilo devia ser o evento sobrenatural dela.
Eu não consigo ter a contagem dos dias, não tenho referência de onde começa ou termina. Riscar a parede com um palito também não parecia ser uma maneira efetiva de ver o tempo passar.
Pego a bebida quente que não tenho ideia de qual seja o sabor, abro a porta e vejo o semblante de sete sombras que pareciam flutuar e estavam longe. Junto uma mistura de vozes que falavam palavras num idioma que eu não compreendia. Fiquei lá parada. Pensando se corria atrás das sombras, mas pensei que se eu corresse podia torcer o pé, ou cair no chão e nunca mais achar essa casa. Não que fosse a melhor coisa do mundo, mas tinha comida pelo menos.
Não sei se passaram anos, mas em um certo dia eu peguei o meu bloco cinza de comida e a bebida quente, e comecei a sentir um aperto no peito, dificuldade de respirar e minha visão ficando turva.
Peguei o meu bloco cinza, abri a porta e corri, corri e corri até não ter mais cinza em minha vista.
Edvaldo Ferreira
Criador do Palavras Brutas, escritor amador de ocasião, sem formação acadêmica, em busca de entender o que sinto através da palavras, ou se não, em busca da jornada constante de autoconhecimento e afeto próprio. Fascinado com cinema e música.
Futuro agitador cultural.
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